Sabe aquela pessoa que pega uma pontinha do fio do novelo e vai puxando, puxando e puxando até que daqui a pouco o novelo não é mais? Jotaê tem essa capacidade. Tá todo mundo falando de uma coisa e ele se atém a um detalhezinho minúsculo e até então insignificante e vai fazendo ele crescer e crescer e crescer até que vira o assunto principal e ninguém mais lembra como foi que começou.
Pois algumas pessoas tem esse poder. De descontextualizar. De desmanchar a cena original, tomar e analisar um pedacinho só. Sem pensar no seu passado. Nem em como ele chegou ali. E analisar qualquer coisa fora do contexto original é desafiador. E normalmente surpreendente. E leva a questionamentos... Se eu fosse atribuir um verbo a Jotaê seria desconstruir.
Mas não é a visão sistêmica a mais desejada no mundo de hoje? Ou, ainda mais, a percepção holística do que nos cerca? Não é considerado um grave pecado observar, tratar, futricar na parte sem ligar para a consequência disso para o todo? Óficorsi que iés. Mas nada impede a admiração pelo detalhe. A experimentação hipotética focada no micro-cosmo.
Tenho uma prima que fotografa esplendidamente detalhes. Essas coisinhas que nos passam despercebidas e que vistas assim, isoladamente, são tão lindas que emocionam. Tirados do contexto protagonizam. Ela enxerga as pequenas coisas mais ou menos como um olheiro percebe a topimódel potencial em uma guria desengonçada qualquer.
Uma vez li um livro, O Perfume, de Patrick Süskind. Isso foi lá no período jurássico, eu estava ainda na faculdade, acho. Lembro que foi um sucesso, na época. E realmente é um livro muito interessante, apesar de meio nojentão. Conta a história de um cara com uma capacidade olfativa muitíssimo acima do normal, enquanto ele próprio não tinha cheiro algum. O incrível é que li tanto sobre cheiros, perfumes e fedores que naquele período fiquei mais suscetível a eles. Meu olfato ficou mais apurado enquanto eu lia o livro.
Da mesma forma, as fotos da minha prima abriram para mim um incrível mundo de coisinhas maravilhosas que eu nunca tinha reparado. Metade das fotos da minha última viagem são de pormenores que até ontem me eram invisíveis.
Pois essas desconstruções contínuas, que Jotaê consegue fazer nos mais improváveis momentos, estão deixando minha dupla de neurônios (o Paulão e o Bola, lembram?) mais antenada para os diversos textos de um determinado contexto. E isso não significa que de agora em diante vou usar a parcialidade ou a visão segmentada como regra de vida. Ou então acreditar eterna e piamente na teoria da conspiração. Nada disso. Pretendo continuar a ser esse ser magnânimo, com uma capacidade de compreensão do mundo e da vida elevadíssima. Claro. Só que agora acho que, mais do que navegar, desconstruir é preciso.