terça-feira, 13 de abril de 2010

Pomba Lesa X Ajudinha

Não, não estou utilizando nenhuma metáfora. As palavras do título são uma transcrição literal do que acabo de fazer. Explico: Desde ontem observo um casal de mini-pombas (na verdade são rolinhas, mas acho essa denominação um pouco pornográfica) tentando fazer um ninho sobre dois galhos paralelos, distantes uns cinco centímetros entre si. Um fica lá em cima (acho que é a fêmea)ajeitando o material de construção que o outro busca no chão. O macho pega um galho seco. Voa com ele no bico. Dá para a fêmea que o coloca no vão entre os galhos e... cai. Ele desce outra vez. Vasculha o gramado. Encontra um emaranhado de gramas secas(dessa vez vai dar certo). Leva para cima. Acomoda pessoalmente (ou pombalmente) no vão. Cai.

Ficaram nesse sobe e desce de grama, de palha, de folhas secas a tarde inteira!!! Já ia anoitecendo quando pareceu que finalmente eles tinham adquirido alguns rudimentos de noção de construção civil. O marido começou a transportar gramas secas e compridas e colocar atravessadas sobre o vão. Ufa!

Mas as fundações não resistiram ao vento forte que soprou à noite. A Nautreza é inclemente. Foram-se embora os alicerces do ninho e as pombinhas. Senti uma ponta de tristeza. Provavelmente a inaptidão para construir um lar minimamente seguro tivesse determinado o divórcio.

Mas não. Ao meio-dia a dupla retornou aos mesmos galhos parelelos e reiniciou a rotina de recolher material de construção e arremessar pelo vão entre os galhos! Não me contive. Peguei um arame bem fininho, subi numa escada e fiz um zigue-zague fechando grosseiramente o vão. Uma base extremamente sólida para um frágil ninho, mas suficientemente delicada para não interferir no projeto arquitetônico da dupla. Sim, uma ajudinha para a natureza. Certo ou errado?

Imediatamente após minha intervenção bateu um arependimento: e se eles não voltassem mais? E se esse vai e vem infrutífero fizesse parte do aprendizado indispensável para a sobrevivência deles? E se eles jamais forem capazes de fazer outro ninho? Já estava a ponto de desfazer tudo quando um deles voltou. Acho que a esposa. Olhou, olhou, caminhou sobre os arames. Inflou todas as penas e ficou em formato de galinha chocando... pareceu ter gostado. Bicou os arames e começou a fazer aquilo com o papo: uh-uh, uh-uh, uh-uh! Linguagem de pomba. Acho que chamando o marido para ver a maraviha de estrutura em aço, extremante atual e alinhada com as novas tendências! Entretanto ele não voltou. Ela chamou ainda mais um tempo mas... nada. Ela também partiu. Melhor um marido sem casa do que uma casa sem marido!

Lamentável. Mas, como esse não é o único lugar do quintal próprio para um ninho, decidi deixar ali minha opção de base para ninhos diversos. Vai que outro pássaro ache interessante? De qualquer forma, fiquei pensando sobre o que deve ter passado na cabeça do pombinho leso que rejeitou minha colaboração:

- Ninho tem que ser só de palha, senão não é ninho! Na minha família sempre foi assim e é assim que deve ser.
- Eu falei: só material reciclável! Mas ela nâo me escuta!
- Imagina o que os outros vão dizer? Que eu não sou capaz de construir minha própria casa?
- Ajuda sem pedir nada em troca? Tô fora!
- Um ninho durável assim? Ela pensa que vai me prender prá sempre?
- Na certa ela financiou isso aí e eu vou ter que arcar com as despesas depois!

E da pombinha lesa:
- Ele ficou com o orgulho ferido!
- Tive que desistir de botar ovos, mas eu o amo assim mesmo!
- Optamos por não ter ninho, assim podemos viajar mais!
- Uma pena! A proposta do arquiteto foi ótima, mas ele detestou!
- Era um ninho para a vida toda!
- Tentei até demais, mas ele não era pombo prá mim!

A Natureza é sábia! É?

Um comentário:

Sérgio Bracagioli disse...

Seres vivos trocam experiências mas apenas os mais evoluidos podem contextualizá-las. As pombinhas provavelmente não puderam. Tu sim. Colocaste, nesse fato simples, tua sensibilidade e a compartilhaste. És a parte da natureza que pode fazê-lo. E me alegro com isso!! Mais uma forma de estarmos próximos.