sábado, 21 de agosto de 2010

Verdadeiro, bom e útil

Há muitos anos li, não lembro onde, uma historinha de um Mestre Zen (seja lá o que isso signifique) que falava para seu pupilo guardar o silêncio. Só deveria falar se aquilo que tivesse a dizer passasse antes por três filtros: O da verdade, o da bondade e o da utilidade. Tem certeza de que é verdadeiro? Não? Então não fale, pois espalhará a mentira. Se tem certeza de que é verdade o que vai ser dito, pergunte-se: É algo bom? Se não for bom, mesmo que verdadeiro, não fale. Mas se for verdadeiro e bom, antes de quebrar o silêncio, ainda se pergunte: Será, essa informação, de alguma forma útil?

Pois em função do filme do qual falei no texto anterior, lembrei desses filtros. As pessoas, ainda que falem somente a verdade, não precisam dizer certas coisas. Quer por não serem coisas boas quer por não serem úteis.

Imaginemos que, num passe de mágica, esses filtros fossem instalados em todas as pessoas. Como num programa de computador, automaticamente, tudo o que fôssemos dizer seria verificado e só sairiam as palavras que tivessem recebido sim para os três quesitos. Que silêncio tomaria conta do mundo! Haveria uma pandemia de mudez seletiva.

Pensa só: Oi, tudo bem? Tudo bom. Após a filtragem ia ficar asim: Oi. Oi.

Oi, tudo bem?
Mentira: Você está pouco se lixando para essa sua vizinha mal-humorada, que errou feio no make up. Por que vai perguntar se está tudo bem?

Tudo bom.
Mentira! A verdade é que ela está com uma cólica daquelas, não dormiu a noite toda, está se sentindo horrível porque não conseguiu disfarçar as olheiras profundas nem com dois quilos de maquiagem e tem uma reunião chata daqui a pouco. Não está nada bem.

E quando ela chegasse no trabalho não ia falar para a colega ao lado: Menina, passei uma noite péssima, mal dormi de tantas cólicas. Não ia dizer nada, pois é verdadeiro, mas não é bom. Tampouco útil. Nem a colega ia contar que adotou um gato de rua ontem. É verdadeiro e bom. Mas cadê a utilidade de contar isso? Iam se olhar e sorrir. Silêncio.

Mas isso pode ser bom? Já que não há um microchip com esse programa (pelo menos não que eu saiba) tento, vez por outra, aplicar de forma deliberada estes filtros politicamente corretos ao meu falar. No mais das vezes, depois que já saiu, percebo que infringi uma, duas ou três regras. Complicado pensar antes. Mas, quando consigo, acabo em dúvida: se é verdadeiro e divertido, pode ser considerado bom e útil?

É um dilema ético. Mas dilemas éticos ficam para o próximo texto.

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