Tomei um baita susto hoje de manhã. Mas bah, tchê? Quem é esse senhor aqui no meu banheiro? Sim, já sei que a oposição de plantão, de forma pouquíssimo original, vai dizer que eu devo ter bebido demais e esquecido do cara que trouxe prá casa ontem à noite! Coisa de gayúcho, acrescentarão. Até seria melhor alternativa. Mas não foi isso. Em casa só eu e meus guaipecas. E, lamentavelmente, esse idoso, de barba branca mal feita e cabelos desgrenhados que me olha fundo nos olhos, sou eu mesmo!
É um alento pensar que Nando Reis já teve um encontro assim com seu espelho. Ele não deve ser mais novo que eu, mas é mais famoso.
Eu não tenho mais a cara que eu tinha
No espelho essa cara já não é minha
É que quando eu me toquei achei tão estranho
A minha barba estava deste tamanho
Não sei o que aconteceu de ontem para hoje. Juro que fiquei assim de repente. Surgiram uns pelos estranhamente compridos nas minhas sobrancelhas. Uns pés de galinha se instalaram nos cantos dos olhos. Minha pele ficou toda manchada.
Voltei rapidamente para a cama. Talvez fosse um pesadelo e quando eu acordasse de verdade as coisas tivessem voltado ao normal. Não adiantou. Repeti o procedimento dezenove vezes. Vai que é um pesadelo recorrente? Nada. Foi então que tive a pior ideia que poderia ter me ocorrido. E digo, não faça isso em casa. Não repita o procedimento que a seguir vou descrever, pois poderá causar danos psicológicos irreversíveis.
Convencido de que era o espelho do banheiro que apresentava problemas, parti em busca de um espelho menor, quadradinho, daqueles bem fuleiros, com a moldura alaranjada, que estava guardado no fundo de um armário (nem sei porque comprei isso um dia). Ainda de pijamas, deitei atravessado sobre a cama, de barriga para baixo, com os braços e a cabeça para fora da cama e coloquei o espelhinho no chão. Horror, horror! O velho foi substituído por um shar pei!! Sabe aquele cachorro que é todo rugas? Minhas bochechas multiplicaram-se assombrosamente, impulsionadas pela força da gravidade. Meu roso todo se descolou de mim! Horror, horror! Não faça isso sem o acompanhamento de um profissional capacitdo. Ou, melhor, não faça isso.
Como judeus de luto pensei em cobrir todos os espelhos da casa. Em evitar paredes envidraçadas. Ao invés disso, decidi enfrentá-lo: espelho espelho meu, podes refletir meu verdadeiro eu?
Vitória! Meu sorriso no espelho era o mesmo que eu tinha quando, moleque, vencia uma boa peleia! O espelho da alma não está pendurado na minha casa. Não está nas vidraças nem nas pessoas que gostam ou que não gostam de mim. Ele não está fora.
E, quer saber? Até que esse velhote aí no banheiro é bem interessante!
Um comentário:
Devo admitir que tua pena me causou também agradável surpresa. Fostes brilhante nos dois textos, apesar do excesso de frescura nas cartas de amor, mas que contém a coerência do que é peculiar em criaturas ultrasensíveis como tu. Calma, neste final de semana estamos dando uma trégua....
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